sábado, 13 de outubro de 2007

A esperança está no ar
1. O poetinha maior, Vinicius de Moares, disse que os bares estão cheios de homens vazios. Sem querer contrariar, acho que os bares também estão cheios de homens cheios de esperança. Eles não bebem p’ra esquecer, mas para, quando, de repente, curados do porre, se redescobrirem e gritarem para si mesmos e para o mundo: “Estou vivo!”, “Estou vivo!”
2. O Bar Esperança, o último que fecha, do filme de Hugo Carvana, o mais carioca dos cineastas, não sei se existiu mesmo. Digo como locação, pois o cenário lembra muito o centenário Bar Luiz , da Carioca, ou mesmo a antiga Cavé (hoje totalmente remodelada e diferente sem perder seu estilo). Se o Bar Luiz, nem a Cavé foram locações da fita, provavelmente o cenário foi inspirado num desses muitos bares da Cidade, que naqueles sofridos anos 70/80, abrigavam todas as angústias e aflições da população. Felizmente, o espírito carioca, sobreviveu apesar da mordaça que a Revolução Redentora impunha a todos.3. Muitos bares daquela época não fechavam. Até fechavam, porém quem estava dentro até podia sair, mas quem estava fora não podia entrar, como o Antigamente, em Botafogo. Tinha os que não fechavam mesmo porque não tinham portas, como o Carlitos na Lagoa, o Mamma Mia na Prado Junior, funcionando direto. O que inventou o mote, e ficava ali no Leblon, na Cupertino Durão, só conseguia amanhecer aberto por que não tinha portas, mas encerrava o expediente cedo.
4. O Antigamente foi um dos últimos bares onde Clara Nunes passou antes de subir p’ro andar de cima, depois de um show no Teatro Opinião, como atração da “Noitada da Samba”, promovida por Leonides Bayer e Jorge Coutinho. Não é um dado biográfico, por isso não deve estar no recém lançado livro do jornalista Wagner Fernandes, com prefácio de José Louzeiro, “Clara Nunes – Guerreira da Utopia” (Ediouro, 372 pgs, R$ 49,90).

5. Nas mesas de bares, os poetas se revelam no torpedo entregue pelo garção à paquera, com o número do telefone ou uma declaração de amor rabiscada no guardanapo. É na mesa de bar, onde os planos são plantados na alma, p’ra não sofrerem solução de continuidade. A esperança é combustível para o sonho não parar pelo caminho. Nos bares, daqueles tempos, a esperança estava no ar, tinha sabor de cerveja e cheiro de fumaça. E gordura. E saía arrastada e cambaleando pela manhã afora, sol na cara e olhos semi-cerrados. O porre podia ser curado com um mergulho no mar ali em frente, com roupa e tudo, mas a esperança se mantinha viva e guardada nos recônditos do cérebro para despertar no coração e na alma daqueles que não nunca desistem do sonho.